GONÇALO BYRNE ARQUITECTOS
 

Lisbon, portugal

2010

 
 

coauthor: Manuel Mateus


Lisbon Cruise Terminal

The history of the city of Lisbon can be told through its relation with the river. The morphological form of the city develops from two main directions in connection to the river, a parallel one and the other perpendicular. The transition between the longitudinal platforms and the orthogonal buildings ends up defining the matrix of the built settlement, but also of the empty spaces between the successive warehouses.

The cruise tourism is transforming the classic concept of tourist travelling where the means of transport was a need but not an end. The visited port tends to be a temporary visiting place, but unlike the container boat, it is mainland of the real city where one can feel the thickness of time, history, and memory. In its turn, the city-ship is designed to be lived as continuous entertainment, without history, and where the thickness of time is erased. From the top of its decks, one contemplates the slow parade of the arriving city in all its stratified complexity, and a desire to emerge in this magnificent specific reality starts to emphasise. 

The architectural form is discovered as a temporal reminiscence of the city’s increasingly evanescent cultural memory to become pure and radical spatiality, to the detriment of a new fictional self-referential artefact that attempts to compete, ingloriously, with the characteristic condition of the cruise ship itself. More than a mimicry of the formal system of the port warehouses of the beginning of the last century, the architectural form assumes a contemporary interpretation that departs from the systemic character of that presence, or what remains of it with the erosion of time, and creates a new tectonic system, which however assimilates fragments of the pre-existence, now recycled into other uses for the city.

Resulting from a cultural rather than tactile and physical legacy, the new architectural presence is re-dug, drilled, and delimited, defining a spatiality and temporality that contains the various spheres that transit between a city-ship, strongly fictional, and the real city. 

The proposal aims to generate a city fabric defining a public space, with non-existent characteristics in the city of Lisbon, containing two distinct squares: the Alfândega square, mineral, static, fully open to the sea, and the transports interface, dynamic and vibrant in light and shadow, designing a gradual transition between the Terminal and the Avenida Infante D. Henrique, through the mediation of a cycle-pedestrian traffic lane, which eventually crosses green and wooded pavement. Depending on the seasonality and varying intervals of cruises, this large square can host different public events (parades, sporting events, shows, concerts, etc.), contributing to reinforcing urban animation.

The occupation along almost one kilometre of quay front by the areas related to the logistics of cruises, requires the retreat of the cycle-pedestrian strip, resuming the visual contact with the river only in the perpendicular squares. By proposing a built-in accompaniment in which the repetitive array of roofs limits a porous spatiality between full and empty spaces, the temporary withdrawal from the river can acquire other enriching experiences.

 
 

Português

 A história da cidade de Lisboa poder-se-ia contar através da sua relação com o rio. A evolução da forma urbana da cidade vai-se adaptando a matrizes de construção e de espaço público que alternam entre a longitudinalidade paralela ao rio e a transversalidade ortogonal ao mesmo. A transição entre a longitudinalidade das plataformas e a ortogonalidade das edificações acaba por definir a matriz do assentamento construído, mas também dos espaços vazios entre as construções, que constituem os sucessivos entrepostos.

O turismo de cruzeiros está, tendencialmente, a transformar o clássico conceito de viagem turística, onde o meio de transporte era necessário, mas não o próprio objecto turístico. O porto visitado é tendencialmente um complemento que se desfruta em tempo limitado e contrariamente ao barco contentor, é a terra firme da cidade real onde se pode sentir a espessura do tempo, da história e da memória. A nave cidade é projectada para ser vivida como um contínuo entretenimento, sem história onde se apaga a espessura do tempo. Quando do alto dos seus decks se contempla o lento desfilar da cidade de chegada em toda a sua complexidade estratificada, acentua-se a vontade de emersão nessa magnífica realidade específica da cidade de Lisboa. 

A proposta pretende privilegiar, sobretudo, a espacialidade. A forma arquitectónica descobre-se enquanto reminiscência temporal da memória cultural da cidade, tendencialmente evanescente, para se tornar pura e radical espacialidade, em detrimento de um novo artefacto auto-referente ficcional que procuraria competir, em vão, com a condição característica da própria nave cruzeira. No limite da memória, escava-se o espaço e a luz (e, com esta, o tempo).

Mais do que uma mimetização do sistema formal dos armazéns portuários do início de século passado, a forma arquitectónica assume uma interpretação contemporânea, que parte do carácter sistémico dessa presença, ou do que dela resta com a erosão do tempo, e cria um novo sistema tectónico, que, no entanto, assimila fragmentos dessas pré-existências, agora reciclados noutros usos para a cidade. Fruto de um legado mais cultural do que táctil e físico, a nova presença arquitectónica é re-cavada, furada, delimitada, definindo uma espacialidade e uma temporalidade que contém os vários âmbitos (dos mais controlados aos totalmente livres) que transitam entre uma “cidade-nave”, fortemente ficcional, e a cidade real. Este novo sistema, que está em terra firme, faz parte da cidade real, reconfigurando-a nos seus aspectos de continuidade histórica e temporal.

A proposta pretende gerar um “pedaço de cidade” com origem num espaço público de características inexistentes na cidade de Lisboa composto por duas praças distintas: a praça da Alfândega, mineral, estática, totalmente aberta ao mar, e a do interface rodoviário, dinâmica e vibrante em luz e sombra, fazendo a transição gradual para a Avenida Infante D. Henrique, através da mediação de uma faixa de circulação ciclo-pedonal, atravessando, eventualmente, pavimentação verde e arborizada. Esta última praça, de grandes dimensões, pode, de acordo com a sazonalidade e os intervalos variáveis dos cruzeiros, acolher diferentes eventos públicos (desfiles, provas desportivas, espectáculos, concertos, etc.), contribuindo para reforçar a animação urbana. 

A ocupação ao longo de quase um quilómetro de frente de cais pelas áreas afectas à logística dos cruzeiros, obriga ao recuo da faixa ciclo-pedonal, retomando o contacto visual com o rio, apenas, nas praças perpendiculares. Ao propor um acompanhamento construído em que a matriz repetitiva das coberturas limita uma espacialidade porosa entre cheios e vazios, o temporário afastamento do rio pode adquirir outras vivências enriquecedoras.